Quando o humor veste a toga

Autor de três livros de poemas, Poesia Natimorta e Versos Sobreviventes (2010), Subversos (2016) e Logorreia (2016), o paraibano Thiago Lia Fook estreia na prosa com Antigamente Era Melhor (Moinhos, 2019), uma breve coletânea de contos. Com 12 textos curtos, o volume destaca-se de início pela experimentação na forma, sobretudo quando ela coincide com os dispositivos importados do outro ofício de Fook (que, como bem aponta a orelha,”navega na velha e gasta jangada de escritores-burocratas”).
É assim com “Boletim de Ocorrência”, que narra um acidente de trânsito e seus desdobramentos numa delegacia, e com a petição de “A Sua Excelência, o Juiz”. Fook renova aquela “velha e gasta jangada” navegando em águas turbulentas, fruto do encontro entre as velhas correntes de um passado aristocrático, no qual a justiça estava submetida às diretrizes do apadrinhamento, e as novas águas de um presente burguês, socialmente mais consciente embora não de todo livre deste elitismo remanescente.
Este choque de visões está presente também em contos em que a convenção narrativa é um pouco mais respeitada, como o ótimo “Danúbio Azul” — sobre uma tia debulhando seu rosário de preconceitos diante do sobrinho — e “Medalhinha milagrosa” — sobre uma mãe narrando ao filho recém-formado sua trajetória de percalços na magistratura.
Pena que tais narrativas se concentrem ao final do livro e seu início resvale num humor ora ingênuo, ora inócuo, com a forma derivando para experiências menos exitosas como a entrevista (caso de “A revolução de 89”) ou a dramaturgia (em “A Loteria de Cartésio”). Estas narrativas revelam ainda um escritor pouco à vontade na medida da prosa, num registro que varia entre a crônica e o conto, sem o estilo que ele parece encontrar nos últimos textos — talvez de uma diferente cepa dos que foram publicados no começo do livro.
Prova disso é que a dose perfeita do humor (calibrando melhor o conjunto de elipses, reviravoltas — numa palavra: o timing que prejudica contos como “War” ou “Triunfo”) só vai ser atingida em “Tchau, querido”, o conto que encerra o livro com a gargalhada final que o autor certamente espera — e o leitor ansiosamente aguarda.
Cotação: 2/5
Review no Goodreads: https://www.goodreads.com/review/show/2855509508
Próxima leitura: O Inferno Atrás da Pia, Antonio Prata