As eternas criaturas de Geraldo Maciel
Morto em 2009, o escritor Geraldo Maciel (o Barreto) foi um dos fundadores do Clube do Conto e o maior contista de sua geração, na Paraíba. Tal patamar se fixou já em sua estreia, com a obra-prima Aquelas Criaturas Tão Estranhas (1995). É ali que seu fabulário começa a se construir, com uma clara herança de outro mestre da narrativa curta: o mexicano Juan Rulfo.
O Concertista e a Concertina (Manufatura, 2006), seu terceiro livro, traz de volta às páginas este universo, explorando as figuras provincianas que habitam o interior inominado visitado por Barreto. São 23 contos breves, seguidos por um arremate um pouco mais longo: o conto “Depois que Sai a Lua”, desta coleção talvez o mais tributário de Rulfo, já que se remete ao tom fantástico de sua prosa sendo protagonizado por um senhor de terras que, por ser o sétimo de uma linhagem de filhos homens, descobrimos ser um lobisomem que vaga pelos eitos de sua propriedade devorando o fígado de crianças para se manter vivo.
As demais narrativas são um pouco mais realistas, destacando-se por um conjunto de histórias que, no miolo do livro, se coadunam e adquirem uma certa uniformidade por tratarem dos ofícios de seus personagens — sempre envoltos em projetos impossíveis, que mobilizam a comunidade produzindo uma tensão criada a partir da expectativas e da descrença. São desta cepa, por exemplo, os textos “O carro”, “A Antena”, “O Coveiro”, “A Festa”, “O Violeiro”, entre outros.
Certos contos estão naquele platô estabelecido por Barreto em seu primeiro livro. São eles “Vida e Morte” e o “Missionário”, ambos curiosamente narrados por vozes femininas: este se reportando a um peregrino franciscano e aquele a um amor impossível, pois que jurado de morte numa rusga familiar que atravessa gerações. É com estas mitologias, coletadas nos rincões cujos ecos Barreto sabia ouvir como ninguém, que sua originalidade aflora, revelando sua prosa desafiadora e ainda insuperável.
Cotação: 3/5 (Bom)
Review no Goodreads: https://www.goodreads.com/review/show/2916886871
Próxima leitura: “Torturas de Amor”, de Bruno Gaudêncio (Org.)
